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domingo, 25 de março de 2007

O preço da "Evolução Moderna"


Criança da cidade grande nunca subiu em abacateiro, catou jabuticaba do tronco, chupou manga no pé. Não conhece o sabor da uvaia,o cheiro da goiaba verde, nem a alegria de encontrar um pé de morango silvestre. Não mordeu caule de azedinha e erva-doce ou fez coleção de pedrinha. Não sabe a diferença entre sabiá e beija-flor, borboleta e mariposa, palmeira e jatobá. Nunca pescou tilápia no rio, tomou banho de cachoeira.

No século passado, criança, bicho do mato e planta tinham uma natureza só. Crescer saudável era levar picada de abelha, mordida de cachorro, queimadura de taturana, tirar carrapato, espinho e bicho-de-pé. Fugir de enxame de abelha, esbarrar em urtiga, coçar mordida de mutuca, pisar em formigueiro e caco de vidro, ralar perna e joelho, arrancar farpa da mão e tampa do dedão. Chafurdar na lama e escorregar em monte de estrume.

As maiores delícias da infância eram: correr descalço na tempestade, chupar cana, rapadura, quebra-queixo, machadinha, maçã do amor, chupeta de açúcar e pé-de-moleque.

Criança de antigamente nunca fez terapia. Tinha medo de sapo-boi, aranha, cobra, morcego e escorpião quando saía para caçar vagalume no meio da escuridão. E também de lobisobem, assombração, chupa-cabra, mula-sem-cabeça, do canto da coruja e de cachorro uivando pra lua.
Nós que aprendemos a ser bicho do mato até em terrenos baldios, privamos nossos filhos das delícias de ser a criança que fomos: as gerações adultas dos útimos 50 anos degradaram dois terços da natureza.

Em nome do progresso, transformamos florestas em lavouras e pastagens, mudamos o curso dos rios, implantamos hidrelétricas, rasgamos estradas, construímos grandes cidades, erigimos prédios e fábricas, asfaltamos ruas, sujamos rios, espantamos passarinhos, dizimamos animais. Para gerar riqueza e crescimento, poluímos a terra,a água e o ar. Também não conseguimos fazer uma boa distribuição de renda.

Nossos filhos pagam o preço, obrigados a se proteger atrás das grades. É claro que você e eu não podemos barrar o curso das coisas. Assim caminha a humanidade. Mas não se espante se seu filho aparecer com um discurso em defesa da floresta, da preservação da água doce e dos animais em extinção. Ele provavelmente descobriu pela Internet que nem tudo no mundo é artificial.

Se ele pedir para separar o lixo reciclável, colabore. Aceite quando ele recomendar que não jogue papel no chão nem deixe a torneira aberta enquanto escova os seu dentes. Ajude o ecossistema quebrando o cimento estéril do seu quintal. Plante uma árvove. Se vc mora em apartamento, cultive um vaso de flor, mantenha restos de frutas na varanda para atrair passarinho, pendure na janela um bebedor de água com açúcar para alimentar colibri.

Ah! E não reclame do videogame do seu filho, nem diga a ele que infância de verdade foi a que você teve.

Cada um vive seu tempo. E escreve a própria história.

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